Um Texto de Obrigados

Yan Sales
2 min readJun 13, 2021

Quase um morcego mudo, voando sem rumo ameaçando se espatifar em qualquer muro por aí: era eu aceitando o transcorrer dos dias por não acreditar que havia que se fazer a respeito. Engraçado olhar para trás e achar inconcebível que aquela minha versão avacalhada vagou por esta terra por tanto tempo.

Uma retrospectiva dos últimos anos aponta que certas coisas merecem mais que enaltecimento ou frases criativas, e a casca — cada vez mais impenetrável — que o tempo nos proporciona não é o bastante para afastar o que mais vale a pena nesta vida. Ela surgiu, acreditou, ficou e quando me dei conta estava tudo diferente, menos eu, que era o mesmo só que muito mais eu, e a razão das coisas serem se tornou quase palpável.

É certo que sozinho eu não conseguiria, até porque não tinha conseguido até então: precisou dela acreditar que pudéssemos ser dois para que eu, individualmente, sentisse o chão que piso menos desconfortável. E ao ver o sucesso de nós dois que eu olhei para mim e me senti tão aqui e tão agora também. Nunca tivera antes um norte tão preciso; era como se o tal morcego tivesse recuperado a voz. E quem sou eu para entrar no mérito do poeta que certa vez lecionou “é impossível ser feliz sozinho”, mas fato é que antes de você chegar o amor não compunha a lista de coisas boas que fazem a pena o sentimento; tampouco a gratidão constava no meu vocabulário até perceber a reviravolta que um sim pode causar na vida de quem já começou desistindo. Mas como tenho dito, sucumbi por não ser totalmente eu como sou agora graças aos seus esforços.

Talvez não seja proporcional um texto de obrigados. Mas obrigado. Obrigado por ter ficado. Obrigado por ter acreditado, por ter olhado para a gente tal como se olham os ingredientes da gastronomia inusitada e no fim dá mais que certo. Obrigado pela repercussão positiva nos mínimos detalhes, que me apresentou uma nova forma de olhar para a frente (tive a sorte lotérica de tê-la ao meu lado para apontar o que estava debaixo do meu nariz e eu não via por razões pessimistas). Obrigado pelo tempo perdido, recuperado e relativizado, além de ter mostrado que ele não é necessariamente contra nós. Obrigado pelo projeto. Obrigado pela nova perspectiva sobre se dar bem na vida. Ah, e meu lado humorista de fundo de quintal segue sendo tão grato quanto eu por estar vivo.

Este texto é mais uma prova de que o amor não é mera reação química; vai, certamente, muito além de mero impulso biológico e nós estamos convictos disso a nosso modo, de um modo tão peculiar que a transcrição beira o improdutivo e talvez o desnecessário.

Parabéns para nós. Te amo.

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